É do conhecimento comum que os cidadãos identificados civilmente não precisam se submeter à identificação criminal. Estamos nos referindo à regra, e não às exceções. Portanto, como regra, as pessoas que possuem identificação civil não necessitam ser identificadas criminalmente, acaso cometam algum delito.
A isenção de identificação criminal geralmente fica ao encargo da autoridade policial, no momento do indiciamento da pessoa que cometeu o delito. Assim, ao cometer um delito e sendo a pessoa levada para uma delegacia de polícia, a autoridade policial decide se há ou não a necessidade de se proceder à identificação criminal.
Analisando que o documento civil apresentado pela pessoa, no ato do indiciamento, é suficiente para provar sua identificação civil, a autoridade policial não procederá à identificação criminal. Caso contrário, não sendo possível aferir com exatidão a identificação civil dessa pessoa, a autoridade policial determinará que seja confeccionado seu Boletim de Identificação Criminal.
Não vamos adentrar no mérito da necessidade de confecção dos Boletins de Identificação Criminal, pois qualquer policial conhece perfeitamente bem sua utilidade, haja vista não ser esse o objetivo deste artigo.
Entretanto, por vários motivos a par da legislação, em muitos casos não se tem confeccionado (ou são confeccionados de forma equivocada) os Boletins de Identificação Criminal, o que causa uma verdadeira balbúrdia nos processos judiciais.
Além disso, em muitos casos os Boletins não estão sendo enviados ao Departamento de Identificação como deveriam e determinam as leis. E muito menos são enviadas cópias legíveis dos documentos que isentam as pessoas da identificação criminal. Isso também é motivo para outro artigo.
Mas, o motivo do presente artigo é tratar do ato de isenção da identificação criminal, desse ato ser da competência dos peritos estatais incumbidos dessa tarefa, com suas consequências para o trabalho diário desses peritos (peritos em papiloscopia).
Todos sabem que grande parte dos criminosos não se trata de pessoas comuns. São pessoas que por um motivo ou outro foram levadas ao mundo dos crimes, mas que, a par do grau de instrução que ostentem, têm grande conhecimento dos caminhos necessários para burlar o sistema criminal.
Em se tratando de criminalidade, lidamos com a exceção, e não com a regra. E essa exceção, que sob seus limites se traduz regra, confirma que a possibilidade de burla do sistema é bem mais acentuada do que a submissão aos seus ditames.
Exatamente por isso, temos defendido que o ato de isenção da identificação criminal seja obrigatoriamente feito por peritos em papiloscopia. Porque hoje em dia vivemos tempos em que o ser humano passou a ser o cerne das questões, e não objeto delas.
O ato de identificar um ser humano ou de isentá-lo da identificação criminal pode trazer consequências no âmbito processual de difícil reparação. Alguns casos têm chegado ao Departamento de Identificação em que promotores de justiça pedem a soltura de criminosos, pois não conseguem aferir com certeza a real identidade das pessoas que estão sendo processadas. Isso já na fase da execução das penas.
O princípio que rege a cabal identificação de uma pessoa se trata de pedra angular no Estado de Direito. Ele afasta o arbítrio estatal em face dos cidadãos, sepultando tempos não muito distantes em que se lançava qualquer um às galés objetivando dar respostas rápidas e fáceis para o clamor popular, principalmente em casos de crimes de repercussão ou que causam comoção generalizada.
Afastar esse princípio é fazer retornar o arbítrio estatal, desejado por alguns, mas inaceitável nos tempos atuais. A dificuldade em se entender que o ser humano deve ser o centro das atenções, nos atos emanados do Estado, notadamente os processuais/criminais, não pode prevalecer sobre a obrigação de se promover justiça e de se tratar os cidadãos com os direitos a que fazem jus, especialmente os afetos a provas técnicas.
Identificação deixou de ser, há muito tempo, apenas um mero ato de nomeação. Identificar, nos dias presentes, significa antes de tudo individualizar.
As isenções da identificação criminal são efetuadas em delegacias pela autoridade policial, sem o acompanhamento do perito em papiloscopia. Essas isenções são enviadas aos processos, na maioria absoluta dos casos sem nem sequer terem passado pelo Departamento de Identificação.
Entretanto, quando surgem as dúvidas sobre identidades no Poder Judiciário, incluindo os casos de isenção, geralmente levantadas por promotores de justiça, os peritos em papiloscopia são chamados para dirimi-las por meio de laudos que atestem a cabal identificação dessas pessoas.
E agora chegamos à questão: os peritos em papiloscopia é que vão ter que afirmar perante a Justiça as reais identidades que lá estão sendo questionadas, inclusive as oriundas das isenções de identificação criminal.
Nada contra os colegas que estão nas delegacias, muito pelo contrário, pois a maioria absoluta deles é da mais alta qualidade, de alta índole e de alta seriedade. O problema é que há casos (vários) em que a expertise de um perito se faz necessária para afastar as dúvidas. E dúvidas em relação a real identidade dos seres humanos, convenhamos, são das mais importantes para serem dirimidas. Mas, devem ser efetivadas no momento ideal. E esse momento é o ato da identificação ou da isenção da identificação criminal.
A discussão em questão é objetivamente técnico/científica, totalmente ligada às atribuições dos peritos em papiloscopia.
O Estado e seus prepostos naturalmente vão indagar: mas, vocês estão querendo colocar um perito em papiloscopia em cada delegacia de polícia para tratar das questões afetas às identificações das pessoas? Respondemos: é exatamente isso! Ou, para o Estado, as cabais identidades dos seres humanos pouco importam, voltando ele ao seu passado arbitrário em que lançava qualquer um nas masmorras?! Além do mais, identificação é caso para ser resolvido por perito em identificação, não é verdade?!
Esta semana, estamos confeccionando mais um laudo tentando resolver mais um caso de dúvida sobre a identidade de um apenado, levantada pelo Ministério Público num processo. Esta semana também um juiz e uma promotora visitaram o Departamento de Identificação, buscando respostas para esses assuntos.
A sorte é que alguns setores da Justiça e do Ministério Público já estão antenados nos problemas que estão surgindo e que podem inviabilizar vários processos. Espera-se o mesmo dos delegados!
Antônio Tadeu Nicoletti Pereira
Perito em Papiloscopia