Nós estamos preparando um texto para tornar públicas algumas opiniões do atual secretário de segurança pública a respeito da condição de experts da grande maioria dos peritos oficiais capixabas, mostrando porque entendemos de forma contrária.
Isso porque o atual secretário frequentemente divulga em reuniões que quase ninguém seria perito na Polícia Técnica, diante do pensamento pra lá de inusitado e particular que ele ostenta em relação ao corpo pericial estatal e sobre a formação que aos peritos deveria ser aplicada, notadamente ligada aos cursos superiores exigidos e sua aplicabilidade nas áreas fins.
Não vamos entrar ainda no mérito dessa questão com a profundidade exigida, pois constará na matéria específica que estamos desenvolvendo, mas um assunto já podemos adiantar e deixar patente: o atual secretário não reconhece o caráter da Acadepol como instituição de ensino e, muito menos, o caráter científico das matérias que nela são ministradas e a capacitação científica que ela atesta.
Um diploma de formação na Acadepol, na área específica das ciências criminais, para o atual secretário nada representa.
Todos sabemos que as Academias de Polícia vêm sendo responsáveis ao longo dos anos pela formação do corpo pericial estatal, no que tange especificamente às ciências aplicadas à resolução dos crimes, a exemplo da Papiloscopia, da Documentoscopia, da Balística, da Fonética, da Grafotecnia, etc.
De forma conjunta, exige-se uma formação universitária do perito para alicerçar sua opinião sobre os vestígios objetos de alguma dessas ciências criminais que possam imbricar na aplicação das ciências afins, a exemplo da Biologia, da Química, da Matemática, da Engenharia, da Contabilidade, etc. Prudente!
A atual exigência de formação superior é uma determinação do Código de Processo Penal.
Hodiernamente, está mais do que claro que o perito deve possuir uma formação multidisciplinar, pois a atuação nos locais de crimes, bem como qualquer vestígio aos crimes relacionado, leva forçosamente ao conhecimento de várias técnicas para a preservação e o levantamento dos vestígios e para os exames concernentes. Além disso, a manutenção da cadeia de custódia tem sido defendida por todos os profissionais do ramo pericial, no mundo inteiro.
Nada obsta, entretanto, se pensar numa equipe multidisciplinar, pois, afinal, perícia é equipe. E, ao contrário do que o secretário pensa e divulga, não existe perito algum no mundo inteiro que seja tão multifacetado a ponto de não depender de outros profissionais e de outras ciências para auxiliá-lo.
As Academias de Polícia
Não nos compete aqui, e nem é o objetivo deste texto, fazer um levantamento histórico sobre a partir de que momento e por quais razões as Academias de Polícia passaram a ministrar todos os postulados aplicados às ciências criminais.
Todos esses postulados foram desenvolvidos e fincaram raízes por meio de estudos levados a cabo por renomados e reconhecidos cientistas, tais como: Edmond Locard, Victor Balthazard, Marcello Malpighi, Alphonse Bertillon, William James Herschel, Henry Faulds, Francis Galton, Frans Von Liszt, Hans Gross, etc.
Constata-se, entretanto, que a aplicação reiterada desses postulados e dessas ciências aos crimes paulatinamente foi levando seus ensinamentos para o campo policial. Alguns permanecem na origem: basta, por exemplo, se abrir qualquer livro de medicina legal e encontraremos os postulados da identificação humana por meio da Papiloscopia estampados em suas páginas.
O certo é que a cada boom, a cada desenvolvimento que as ciências criminais desfrutam, e da ligação que esse desenvolvimento possui com tal ou qual ciência afim, seus ensinamentos tanto se aproximam da atividade policial quanto se aproximam de uma determinada ciência afim. Por exemplo: a criação e o desenvolvimento dos sistemas automáticos de identificação por meio de impressões papilares (afis) se deram fora das Academias Policiais. Isso ocorreu nos grandes centros empresariais e tecnológicos. Mas, nas próximas formações de peritos em Papiloscopia, o sistema afis será ministrado na Acadepol, provavelmente por um perito com formação e experiência no assunto. E assim em relação a todas as demais áreas.
Isso, evidentemente, não menoscaba e nada tem a ver com ausência de caráter científico das matérias ministradas nas Academias, pois os postulados que nelas serão aplicados estão comprovados à exaustão nos campos e nas áreas competentes. Além disso, somente as Academias possuem conhecimento suficiente, ainda, para ministrar com qualidade reconhecida os postulados inerentes às ciências criminais. Nenhuma universidade brasileira possui, na atualidade, corpo docente eficaz e plenamente direcionado para tal.
E no que tange à formação daqueles que ministram ensinamentos nas Academias, objetivando categorizar institucionalmente o que repassam, os governos que tratem de estabelecer critérios claros aceitos pela comunidade científica. Sugerimos a troca do nome Academia de Polícia para Universidade Federal de Polícia. Dessa forma, passa a agradar a gregos e a troianos!
No mínimo, as Academias Policiais aprimoram esses postulados ao longo dos anos, quando reiteradamente passam a ser aplicados às atividades de investigação criminal. Assim por exemplo, o uso da Poroscopia à identificação humana não possui antecedentes na literatura científica. Ele foi descoberto pela curiosidade pericial e aplicado à resolução de crimes para, concomitantemente, ter seus postulados confirmados pela medicina legal.
Entretanto, pelo pensamento do atual secretário, somente quem pode dar caráter científico a um determinado assunto são as universidades, em seus cursos, principalmente as federais. Uma espécie de monopólio da produção e distribuição de ciência e de tecnologia que não possui equivalente em nenhuma parte do mundo.
Evidente que as universidades são grandes centros produtores de ciência e tecnologia, na atualidade. Mas, não são os únicos. Aliás, nenhum postulado matemático, químico, físico, biológico, etc, nasceu nos bancos universitários. Pitágoras, Galileo, Newton, etc, nem mesmo conheceram universidades!
Não pode vir alguém sem bom senso querer ressucitar alguns deles do túmulo para dar aulas nas universidades. Quem repassa seus ensinamentos são os professores. Se mal ou bem preparados para tanto, depende da formação que tiveram. Por outro lado, ninguém nunca pretendeu jogar por terra o caráter científico de matérias muito mal ministradas, nos centros universitários, por alguns péssimos professores.
As Academias de Polícia, pelo pensamento do atual secretário não deveriam nem levar essa nomenclatura, pois nelas não poderia existir produção e distribuição de ciência, bem como nelas não poderia haver qualquer vida inteligente. Sob esse pensamento, a bem da verdade, não sabemos nem por que existem.
Enfim, para as elites, como sempre, se for ligado à polícia só pode ter caráter de bate-pau, e não de ciência. Naturalmente, porque para elas quem faz polícia e segurança pública e resolve crimes são os experts dos gabinetes e os doutores universitários.
Cursos da Acadepol como extensão universitária
Finalizando, não podemos negar que perícia e universidade devem caminhar de mãos dadas, permanentemente. Até pelas peculiaridades existentes no Brasil. Exatamente por isso, mantivemos contato com a Ufes esta semana para propor a criação do CURSO DE BACHAREL EM CIÊNCIAS CRIMINAIS.
Entramos em contato também com a Diretora da Acadepol, Fabiana Maioral Foresto, propondo que seja feito um documento conjunto para ser entregue na Universidade, pleiteando a criação do curso e que a Acadepol seja incumbida de ministra-lo para os futuros peritos capixabas. O Curso seria da Ufes, mas ministrado na Acadepol. Segundo informações, há até verba federal disponível para tanto.
Com o provável fim do vestibular na Ufes, os critérios utilizados para ingresso no Curso de Bacharel em Ciências Criminais seriam os mesmos utilizados para os demais cursos da Universidade. E, para virar perito oficial, a exigência dos candidatos ao concurso seria a conclusão do referido curso.
Marcamos uma conversa com a Diretora da Acadepol para depois do feriado, a fim de discutirmos detalhadamente a proposta a ser feita para a Ufes.
Ou o governo definitivamente une perícia e ciência por meio das universidades, ou que encontre secretários que entendam e respeitem os cursos ministrados nas Academias de Polícia como institucionalizados, dados por pessoas e órgãos que têm competência no assunto e legitimidade, findando a divulgação de opiniões depreciativas para o corpo pericial estatal.
Antônio Tadeu Nicoletti Pereira